quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

A visão de Deus


(A Gênese - A Gênese segundo o Espiritismo, cap. II - Deus, itens 31 a 37)

31. Se Deus está em toda parte, por que não o vemos? Vê-lo-emos quando deixarmos a Terra? Tais as perguntas que se formulam todos os dias. À primeira é fácil responder. Por serem limitadas as percepções dos nossos órgãos visuais, elas os tornam inaptos à visão de certas coisas, mesmo materiais. Alguns fluidos nos fogem totalmente à visão e aos instrumentos de análise; entretanto, não duvidamos da existência deles. Vemos os efeitos da peste, mas não vemos o fluido que a transporta; vemos os corpos em movimento sob a influência da força de gravitação, mas não vemos essa força.
 
32. Os nossos órgãos materiais não podem perceber as coisas de essência espiritual. Unicamente com a visão espiritual é que podemos ver os Espíritos e as coisas do mundo imaterial. Somente a nossa alma, portanto, pode ter a percepção de Deus. Dar-se-á que ela o veja logo após a morte? A esse respeito, só as comunicações de além-túmulo nos podem instruir. Por elas sabemos que a visão de Deus constitui privilégio das mais purificadas almas e que bem poucas, ao deixarem o envoltório terrestre, se encontram no grau de desmaterialização necessária a tal efeito. Uma comparação vulgar o tornará facilmente compreensível.
 
33. Uma pessoa que se ache no fundo de um vale, envolvido por densa bruma, não vê o Sol. Entretanto, pela luz difusa, percebe que está fazendo Sol. Se entra a subir a montanha, à medida que for ascendendo, o nevoeiro se irá tornando mais claro, a luz cada vez mais viva. Contudo, ainda não verá o Sol. Só depois que se haja elevado acima da camada brumosa e chegado a um ponto onde o ar esteja perfeitamente límpido, ela o contemplará em todo o seu esplendor. O mesmo se dá com a alma. O envoltório perispirítico, conquanto nos seja invisível e impalpável, é, com relação a ela, verdadeira matéria, ainda grosseira demais para certas percepções. Ele, porém, se espiritualiza, à proporção que a alma se eleva em moralidade. As imperfeições da alma são quais camadas nevoentas que lhe obscurecem a visão. Cada imperfeição de que ela se desfaz é uma mácula a menos; todavia, só depois de se haver depurado completamente é que goza da plenitude das suas faculdades.
 
34. Sendo Deus a essência divina por excelência, unicamente os Espíritos que atingiram o mais alto grau de desmaterialização o podem perceber. Pelo fato de não o verem, não se segue que os Espíritos imperfeitos estejam mais distantes dele do que os outros; esses Espíritos, como os demais, como todos os seres da Natureza, se encontram mergulhados no fluido divino, do mesmo modo que nós o estamos na luz. O que há é que as imperfeições daqueles Espíritos são vapores que os impedem de vê-lo. Quando o nevoeiro se dissipar, vê-lo-ão resplandecer. Para isso, não lhes é preciso subir, nem procurá-lo nas profundezas do infinito. Desimpedida a visão espiritual das belidas que a obscureciam, eles o verão de todo lugar onde se achem, mesmo da Terra, porquanto Deus está em toda parte.
 
35. O Espírito só se depura com o tempo, sendo as diversas encarnações o alambique em cujo fundo deixa de cada vez algumas impurezas. Com o abandonar o seu invólucro corpóreo, os Espíritos não se despojam instantaneamente de suas imperfeições, razão por que, depois da morte, não veem Deus mais do que o viam quando vivos; mas, à medida que se depuram, têm dele uma intuição mais clara. Não o veem, mas compreendem-no melhor; a luz é menos difusa. Quando, pois, alguns Espíritos dizem que Deus lhes proíbe que respondam a uma dada pergunta não é que Deus lhes apareça, ou dirija a palavra, para lhes ordenar ou proibir isto ou aquilo, não; eles, porém, o sentem; recebem os eflúvios do seu pensamento, como nos sucede com relação aos Espíritos que nos envolvem em seus fluidos, embora não os vejamos.
 
36. Nenhum homem, conseguintemente, pode ver Deus com os olhos da carne. Se essa graça fosse concedida a alguns, só o seria no estado de êxtase, quando a alma se acha tão desprendida dos laços da matéria que torna possível o fato durante a encarnação. Tal privilégio, aliás, exclusivamente pertenceria a almas de eleição, encarnadas em missão, que não em expiação. Mas, como os Espíritos da mais elevada categoria refulgem de ofuscante brilho, pode dar-se que Espíritos menos elevados, encarnados ou desencarnados, maravilhados com o esplendor de que aqueles se mostram cercados, suponham estar vendo o próprio Deus. É como quem vê um ministro e o toma pelo seu soberano.
 
37. Sob que aparência se apresenta Deus aos que se tornaram dignos de vê-lo? Será sob uma forma qualquer? Sob uma figura humana, ou como um foco de resplendente luz? A linguagem humana é impotente para dizê-lo, porque não existe para nós nenhum ponto de comparação capaz de nos facultar uma ideia de tal coisa. Somos quais cegos de nascença a quem procurassem inutilmente fazer compreendessem o brilho do Sol. A nossa linguagem é limitada pelas nossas necessidades e pelo círculo das nossas ideias; a dos selvagens não poderia descrever as maravilhas da civilização; a dos povos mais civilizados é extremamente pobre para descrever os esplendores dos céus, a nossa inteligência muito restrita para os compreender e a nossa vista, por muito fraca, ficaria deslumbrada.

ALLAN KARDEC


Visto em http://ipeak.net/ - 22/02/2017
 

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